Esboço para a crítica da vanguarda

Maxwell

Esta pequena contribuição se dirige a tod@s nós que pretendemos revolucionar o cotidiano e cotidianizar a revolução. A tod@s nós, porque abordará questões e problemas que não dizem respeito apenas às/aos Proletarizad@s Contra a Corrente, pois se trata de combater uma cultura política bastante cristalizada nos movimentos sociais. Nesse esforço, tento identificar alguns sinais da superação dessa cultura política. E não poderiam deixar de ser meros sinais, pois apenas a experiência prática da ruptura com o vanguardismo pode superá-lo de fato.

A ideologia da vanguarda

Vanguarda, tal como aqui será tratada, é a expressão da separação originada na hierarquia social capitalista em todo o espaço da sociabilidade. Se a hierarquia social produz setores especializados, em muitos momentos é a própria luta d@s proletarizad@s que reproduz, também em seu interior, tais hierarquias. Pretensas precursoras de diversos movimentos de conteúdo social, acabaram cedo ou tarde substituindo-os. Elas de fato existem. Não são mais, entretanto, que expressão da reprodução das hierarquias sociais pelas lutas d@s proletarizad@s. Isso está longe de significar que elas possuem ou devam possuir qualquer papel revolucionário na luta pela abolição de todas as classes. Ao contrário, a sua existência mesma é produto das desigualdades e das separações da sociedade fundada numa divisão em classes sociais. Essa é a demonstração de que elas são algo contra o que @s proletarizad@s devemos lutar e jamais devem ser transformadas em "virtude revolucionária".

A sociedade produtora de mercadorias, constituindo a experiência social como experiência reificada, com todo seu exército de especialistas e, em sincronia com este processo e como parte dele, a formação de seus Estados nacionais (agora em vias de avançada transnacionalização), elevou as parcelas resolutas e "cultas" dos protagonistas de lutas sociais contra o sistema feudal à condição privilegiada de condutoras dos processos pela conquista do poder político, através da representação do Estado moderno democrático. Assim, as revoluções burguesas apresentaram ao mundo as primeiras vanguardas representativas: os partidos de seus respectivos Estados nacionais. As vanguardas políticas são, portanto, produtos tipicamente burgueses.

É interessante observar que, a partir de fins do século XIX, o esforço de modernização da democracia representativa passou a contar com a generosa ajuda da socialdemocracia, que autoproclamou-se "representante histórica (substituta política, portanto) do proletariado", através da criação e do fortalecimento dos "partidos operários de massa" da II Internacional. Para isso, contou com especialistas, os ideólogos, encarregados de transformar em dogma e em justificar, portanto, determinadas posições teóricas defendidas por Marx. Tais posições também foram utilizadas por Lênin e outros socialdemocratas radicais para a cristalização da idéia da necessidade da vanguarda (partido) revolucionária (o), principalmente na obra-prima da ideologia organizativa dos militantes estatistas: Que Fazer?, de 1902.

Marx nunca fez uma defesa explícita de que os comunistas deveriam se portar como uma vanguarda que substituísse o restante da classe. O Manifesto Comunista de 1848 aponta exatamente o contrário, visto que a posição de que a libertação dos trabalhadores deve ser obra dos próprios trabalhadores está diretamente ligada à idéia de que "os comunistas não formam um partido à parte, oposto aos demais partidos operários, não têm interesses que os separem do proletariado em geral e não proclamam princípios particulares, segundo os quais pretenderiam modelar o movimento operário". Para Marx, o papel de "vanguarda" (eis um termo que em nenhum momento é utilizado por Marx no Manifesto!) dos comunistas se resumiria ao fato de constituírem "a fração mais resoluta dos partidos operários de cada país, a fração que impulsiona as demais", pois "teoricamente têm sobre o resto do proletariado a vantagem de uma compreensão nítida das condições, da marcha e dos fins gerais do movimento proletário" (itálicos meus). Bem, isso corresponde em certa medida ao que diz a Internacional Situacionista: "Ser de vanguarda é caminhar a par da realidade. A crítica radical do mundo moderno precisa de ter agora como objetivo a totalidade". Poderíamos então dizer que a vantagem das supostas frações mais conscientes d@s proletarizad@s seria a de terem essa compreensão de totalidade, lutando para adquiri-la de fato – pois não é algo dado de bandeja! – e, sem colocar-se como sujeito acima ou à frente do conjunto da classe, sem impor modelos, desenvolvendo-a na experiência cotidiana.

Aquilo que em Marx era uma "vantagem", acabou sendo lapidada por Lassale, Kautsky e posteriormente Lênin no sentido puramente ideológico de enfatizar a necessidade da existência do partido como vanguarda da classe, especialista, profissionalizado, seja de "quadros" ou de "massas", baseado sempre, em nítidas e sólidas divisões entre trabalho manual e intelectual e entre dirigentes e dirigidos, ou seja, sempre reproduzido as separações próprias da sociedade produtora de mercadorias, da política e do Estado.

Não quero dizer aqui que Marx não tenha sido vanguardista em seu cotidiano, mesmo sem que tenha havido a defesa teórica disso pelo próprio. Àquela época, todos tendiam a agir e pensar como vanguarda dado que esta era uma realidade da experiência naquela situação histórica, pois era marcada também pelas tortuosas tentativas da intelectualidade e da militância revolucionária récem-saída das revoluções liberais burguesas desde fins do século XVIII até metade do século XIX por ligar-se às primeiras experiências de organização efetiva d@s proletarizad@s e pela busca de traduzi-las teoricamente. Marx, Blanqui, Bakunin, fabianos etc, ao defenderem a necessidade de partidos, sociedades secretas ou sindicatos para que o conjunto d@s proletarizad@s se contrapusesse à política burguesa e seus partidos, tentavam desvendar a melhor maneira de edificar a revolução social (ou as reformas, para alguns!). Foi (e sempre é ou deve ser!) a própria experiência histórica d@s proletarizad@s que forneceu (e fornece!) a possibilidade de hoje extrairmos todas as lições necessárias que nos levam a concluir sobre a imperiosa necessidade de combatermos sem tréguas as vanguardas, indicando inclusive os equívocos dos "clássicos"!

A grande vitória bolchevique (e grande derrota do proletariado!) na Rússia até 1921, é o totem comum dos vanguardistas mais generosos (anti-stalinistas, diga-se de passagem) que tem servido para justificar dogmaticamente que "as vanguardas são corpos necessários e/ou inevitáveis na luta de classes". Os mais extremados dizem que a elas competem "conduzir e dirigir a classe", as lutas d@s proletarizad@s. Outros, mais "generosos", admitem que o problema não é a existência em si das vanguardas mas como elas se conduzem no processo revolucionário, reduzindo a discussão a termos morais e fenomenológicos. Para estes elas podem ser várias e são "objetivamente produzidas nos conflitos revolucionários" e até mesmo nos períodos de "calmaria política", onde teriam um papel central na dinâmica social. Guia, direção, instrumento, ente acima, ente à frente, tantas e quantas idéias a respeito de algo que se pôs historicamente como uma tragédia no movimento operário nada mais são do que ideologias auto-suficientes predestinadas a justificar a "imperatividade e excelência" das vanguardas nas lutas de classe. O que temos, em todos esses discursos estatistas são sujeitos que substituem a classe em seu conjunto ou que, mesmo não a substituindo, se põem como os únicos ou os "fundamentais" condicionantes para o "avanço" da mesma.

Os movimentos autônomos diante da política de esquerda

Os coletivos/movimentos autônomos, sejam eles grupelhos, movimentos socialmente enraizados ou tipos intermediários, quando conseguem ir além da "prédica de doutrinas" ou princípios abstratos, podem tanto atrapalhar o desenvolvimento da revolução como ajudar a que ela avance, evidentemente de acordo com as condições históricas. Neste caso, tudo depende da relação social que os tais ajudam a construir concretamente com as suas atitudes. Se tais atitudes reforçam uma sociabilidade baseada nas hierarquias, no fetichismo da mercadoria, então o desastre torna-se inevitável.

A burguesia edificou o seu Estado como um correspondente ao fundamento do trabalho abstrato, que em sua forma assalariada aliena o produtor face ao que o próprio produz, condição básica para que o valor de uso materialize-se como mercadoria. O Estado representativo da modernidade é uma obra burguesa fundamental para apartar a imensa maioria (proletarizada) da humanidade das decisões que garantem o controle social necessário à continuidade da produção de mercadorias e do lucro – a reprodução do capital. A política e suas correspondentes instituições só pode servir para alienar os movimentos sociais d@s proletarizad@s em relação à verdadeira e única possibilidade de realização plena de seus anseios e reivindicações de liberdade e de igualdade social, que é a luta direta autônoma. Assim, a luta política serviu, historicamente, para contrapor-se à ação direta d@s proletarizad@s e corromper as suas lutas sociais, integrando-as à lógica do mercado e do Estado.

A cultura política burguesa foi reproduzida dramaticamente na tradição da chamada esquerda. As "vanguardas proletárias", enquanto representantes sobrepostos às chamadas "massas", ou seja, como direções que personificariam os anseios de uma população de dirigidos, acabaram realizando no plano da luta política o que o capitalista realiza no plano da economia, pelo qual é usurpado do trabalhador o domínio dos meios de produção e a harmonia com a própria vida, a de seus pares e da natureza. As autoproclamadas "vanguardas proletárias" apenas se apropriaram com um viés de classe – tratava-se afinal de impor e fortalecer uma nova dominação de classe – do que a burguesia realizou como o essencial de sua obra política: a suprema prática da representação. A alienação d@s proletarizad@s foi aperfeiçoada com a política, tão fetichizada quanto a mercadoria. Essa fetichização se reflete na superestimação da direção/representação que retira dos indivíduos o poder de decidir sobre suas próprias vidas. Os políticos tornam-se, por este caminho, os especialistas estatais da sociedade moldada segundo o mercado e a política nesse contexto é nada mais do que uma mercadoria que só se viabiliza mediante a concorrência e que só pode ser exercida por quem aceita as regras das leis da selva, seja da institucionalidade burguesa, seja da institucionalidade "revolucionária". Os que aceitam tais regras, seja à esquerda ou à direita, obrigam-se a relegar @s representad@s/dirigid@s um papel no máximo de coadjuvantes. É que no mundo reificado do capital, a política é instrumento de castração da autonomia e de toda possibilidade das coletividades proletarizadas romperem com a passividade. As vanguardas são as potencializadoras da política, portando-se, no jogo das separações e racionalizações desse mundo, como um privilegiado agente de conservação das hierarquias na vida cotidiana.

Mas por que deveríamos estranhar esse deplorável papel de estimuladoras da passividade que as "vanguardas proletárias" realizaram? Afinal, elas esqueceram de retomar e desenvolver a crítica da economia política, preferindo aplicar as receitas ideológicas, principalmente as marxistas dos marxistas. O pior é que uma considerável parte delas agora aprofunda os seus erros, desta vez centrando seus esforços em "repensar o marxismo" ou outros ismos ideológicos, talvez para substituí-los por outras receitas, marxistas ou não! Neste caso, a ideologia continua encarcerando a teoria, mesmo com o colapso de tantas verdades, antes consideradas verdadeiros dogmas... É que a emenda costuma sair pior do que o soneto.

Os guetos políticos

Há também o outro viés da cultura política da esquerda que se faz sentir em alguns setores ditos revolucionários: trata-se do contentamento com a condição de gueto político. Aqui é exigida uma relativização a fim de evitar generalizações. Nem todos os vanguardistas se contentam, acostumam, submetem etc, ao gueto político e nem todos os que estão no gueto político são vanguardistas (pelo menos não desejam ser...). Evidentemente, não há nada mais terrível do que guetos políticos conscientemente vanguardistas: são as seitas "principistas" que se apegam triunfalmente às suas ideologias como se fossem tábuas sagradas a ao rótulo de vanguarda como se fosse o melhor de todos os orgasmos. Mas não é especificamente sobre os vanguardistas de carteirinha que gostaria de falar aqui. Afinal, chutar cachorro morto é também antiecológico. Penso que agora o importante e frutífero –que ademais é também ecológico – é analisar rapidamente os que estão no gueto político mas que têm uma repulsa não apenas ao vanguardismo mas também a tudo aquilo que possa parecer-se com uma vanguarda, pois há, entre estes, ao menos boa vontade.

Muitos revolucionários repelem muito justamente as trágicas experiências levadas a cabo pelas autoproclamadas "vanguardas" do movimento proletário neste século, dominadas pela ideologia vanguardista. Entretanto, o trauma produziu nesses revolucionários um retraimento em guetos que procuram realizar mundos à parte em função de experiências autogestionárias particulares, reforçando várias espécies de reformismos da vida cotidiana e o surgimento de novas ideologias. O ato psicossocial da repulsa tanto inibiu-lhes o esforço de buscar um diálogo mais amplo e próximo da luta real d@s demais proletarizad@s como impediu-lhes a realização de uma crítica prática mais conseqüente. Ademais, o problema não está em ser anti-vanguarda, é evidente, mas em agir como gueto em nome da repulsa ao vanguardismo. Um exemplo bastante ilustrativo disso é o fato de que muitos setores libertários (a maioria dos guetos anti-vanguarda são libertários, anarquistas incluídos!) acabam erroneamente identificando o vanguardismo apenas com a tradição marxista, chamada de autoritária, sem perceber que dentro do próprio anarquismo, por exemplo, houveram segmentos importantes que foram desde o reconhecimento da importância de uma vanguarda até mesmo ao próprio vanguardismo (ver por exemplo o posicionamento dos "Amigos de Durruti" na revolução espanhola e a plataforma organizacional de Nestor Makno).

O que caracteriza os guetos anti-vanguarda é basicamente que, em nome da rejeição a tudo o que diga respeito à vanguarda política, acabam reduzindo suas ações ao universo de seus grupos de afinidade, construindo movimentos voltados apenas para outros guetos que se identificam ou se aproximam de suas ideologias. Nas maioria das vezes, o correto cuidado que se deve ter a fim de evitar a sedutora tentação de induzir pessoas a seguirem líderes ou de "dar direção" a processos revolucionários se dilui na própria ausência de qualquer relação direta fora de seus "territórios". O resultado mais visível dessa situação é que @s proletarizad@s em geral ignoram a existência desses guetos e muito naturalmente desprezam qualquer convocação superestrutural deles à luta ou mesmo desaprovam suas ações independentes devido quase sempre à manipulação do mass media. Os guetos têm procurado minorar esse problema apostando numa comunicação "de massas" com a chamada "sociedade civil". Dizer que a criação de uma mídia d@s proletarizad@s autônoma/independente resolve em parte o problema que isso traz é uma meia verdade, na medida em que permanece uma espécie de "propagandismo" heterônomo, ou seja, um esforço por conseguir a simpatia e a solidariedade de uma "massa amorfa", não partícipe direta do processo de auto-organização. Nesse caso o gueto permanece incólume e tende-se à criação de um novo vanguardismo, baseado em furiosas ou pacíficas ações de efeito que objetivamente "representariam" o descontentamento geral, como de fato tem acontecido (por exemplo, uma pesquisa de opinião logo após a ação global em Quebec no dia 20 de Abril deste ano constatou um aumento considerável do repúdio à ALCA por parte da população daquela cidade).

Não podemos afirmar que a postura dos guetos anti-vanguarda seja negativa. Há excelentes contribuições no campo da construção cotidiana individual de valores libertários, de atitudes revolucionárias. E há também o desabrochar de uma boa leva de ativistas, mas neste caso se revela um limite estrutural: a própria cultura política ativista dificulta uma atitude mais conseqüente de diálogo prático e permanente com @s demais proletarizad@s em luta que potencialize a ação autônoma de milhões.

Mas, afinal, será mesmo impossível uma crítica prática do ponto de vista da nossa auto-organização que nos retire do ostracismo e ao mesmo tempo solidifique a existência de uma coletividade horizontalmente bem mais ampla e numerosa como força revolucionária insurgente? Podemos exercer tal prática sem que nos portemos como a vanguarda, tão bem concebida e realizada pela tradição estatista da esquerda? Meu apelo é para que comecemos a refletir mais seriamente enquanto experimentamos alternativas práticas...

A fórmula lassaleana e sua antítese

Para a tradição estatista da esquerda, a vanguarda é o protagonista da nova sociabilidade revolucionária, já que é considerada a portadora privilegiada de uma "consciência política totalizante, completa". Por esta lógica, claro, a vanguarda pode e deve nascer desde fora do movimento d@s proletarizad@s com a "missão" de aí introduzir a politização. Daí necessariamente ter que haver uma "parcela mais ativa da classe" separada d@s demais proletarizad@s. Tal parcela mais ativa seria aquela que, pela sua atividade teórico-prática, se credenciaria como "legítima representante dos interesses históricos de toda a classe". A ela se convencionou denominar partido, embora não seja preciso ter o nome de partido ou ser partido para portar-se como essa parcela "esclarecida"; pouco importa o rótulo que se dê a isso quando o fundamental é a relação social que se firma concretamente. A principal "virtude" de um revolucionário seria, nesses casos, ser vanguarda, ser um "dos melhores filhos do povo" e coisas do tipo (noutra oportunidade falarei sobre a miserável e diversificada psicologia de vanguarda da militância revolucionária).

Entretanto, aquilo que historicamente significou essa cultura política, a da ideologia vanguardista, é um argumento inelutável para que, desde a raiz de nossos esforços, nos neguemos a estabelecer quaisquer experiências que criem e reforcem vanguardas. O problema fundamental coloca-se do seguinte modo: como exercer na crítica prática formas de auto-organização que não reproduzam as hierarquias que justamente queremos negar e que contribuam, assim, efetivamente, para construir um movimento revolucionário autônomo capaz de estabelecer por si e para si seus instrumentos organizativos horizontais de acordo com suas próprias demandas e possibilidades históricas? É essa própria experiência que deve ir constituindo, através da luta autônoma por autonomia, os valores e as formas da nova sociedade revolucionária que almejamos.

Quase toda a prática organizativa da dita esquerda revolucionária se fundamentou, no século XX principalmente, na luta por um "Estado proletário", esforçando-se então para que a própria vanguarda exercesse o papel de "direção" e de "representante dos interesses de toda a classe revolucionária". A justificativa ideológica disso sempre foi a de que o partido, materializando organizativamente a vanguarda, é o lugar de "encontro da teoria revolucionária com o movimento da classe" (como bem dizia Ferdinando Lassale, defensor ardoroso de um "Estado popular" e de um partido "muitíssimo depurado", de elite). A vanguarda enxertaria o "insosso movimento espontâneo" com o "sal" revolucionário produzido nas salinas da própria vanguarda. Sabemos como a adoção dessa fórmula por Lênin foi uma "pérola" para os bolcheviques antes, durante e após a tomada do poder de Estado em 1917 e depois para o estalinismo, o trotskysmo, o maoismo e companhia.

A vanguarda como obstáculo para a comunicabilidade

A vanguarda, seja ela "guia", "direção", "instrumento", "partido", "movimento", etc, é protagonista do espetáculo político e o transmite às/aos demais proletarizad@s, pretendendo induzir as (por ela) chamadas "massas" a uma interminável espera de resoluções de seus problemas por outrem ou, no máximo, a um protagonismo tutelado por direções esclarecidas. Essa sedução é de grande capacidade para neutralizar a autonomia e manter nos movimentos sociais d@s proletarizad@s a lógica da institucionalidade estatal, proto-estatal, semi-estatal ou até mesmo anti-estatal (ONGs e cooperativas, por exemplo) inclusive garantindo o seu "bom funcionamento", por mais podridão que possa existir em seu interior. Até mesmo o mais "radical" esquerdista, ardoroso defensor da luta armada para "derrubar o sistema", está prestando um enorme prejuízo à luta autônoma d@s proletarizad@s na medida em que a ação real, efetiva, dele e de seu especialismo político e/ou militar usurpa a autonomia (poder próprio) d@s proletarizad@s e eforça a heteronomia (poder de outrem), mudando a sociedade e a vida cotidiana apenas aparentemente.

A busca pela autonomia revolucionária é fundamental, mas muito difícil de realizar devido à vivência alienada da sociedade mercantil. Ora, experimentamos desde cedo a conservação da ordem e a passividade que nos leva a acreditar que ser vanguarda (estar sempre à frente!) em algum locus da sociedade é o sentido primordial da vida. A idéia de liberdade, igualdade e fraternidade que a burguesia desenvolveu em sua luta pelo poder sempre foi vanguardista, fomentando o individualismo, o orgulho, a representação e o paternalismo, dentre outros valores mercanto-estatistas, os quais, com vernizes "classistas", acabaram sendo incorporados pelas "vanguardas do proletariado". É bom salientar isto porque devemos estar conscientes de nossa fragilidade e de que estaremos obrigados a aprender remando contra a corrente em águas sempre pouco conhecidas...!

A renúncia prática ao vanguardismo e ao especialismo devem ter como conseqüência o esforço no sentido de que nossa atuação se resume a buscar contribuir para que todos @s proletarizad@s sejamos sujeitos autônomos e construamos nossos órgãos de autonomia (contra-poder).

Cometeremos um grave erro se pensarmos tanto que já somos sujeitos autônomos por excelência apenas pela teoria que defendemos ou estilo de vida que levamos individualmente ou em nosso movimento particular como que, por esta fictícia condição, ensinaremos autonomia aos demais proletarizad@s. Neste caso, a retórica sobre não ser vanguardista seria totalmente vazia. A autonomia não se ensina – não adianta apelar para a razão – e nem se decreta. Ela é construída na e pela experiência. O reapropriar-se da vida, a busca da condição de ser humano livre é um aprendizado e uma apreensão realizados por tod@s, na experiência comum e na solidariedade coletiva. Deve ser uma simbiose social e cultural baseada no diálogo prático. Como coletivos/movimentos autônomos, precisamos lutar para abolir de nossa prática organizativa quaisquer fronteiras existentes entre nós e @s demais proletarizad@s (Lenin, em "Que Fazer?", absorvido que era pela ideologia vanguardista, cita um trecho de uma carta de Lassale a Marx na qual Lassale afirma que a melhor prova da fraqueza de um partido é sua posição difusa e a extinção de fronteiras nitidamente traçadas e que tal partido reforça-se depurando-se ... De fato tratava-se aí de manter e reforçar a hierarquia própria da política). Sejamos, na nossa experiência, prática e teoricamente contrários a qualquer "depuração" que nos coloque como os especialistas que se arvoram de "representar a classe e/ou seus anseios históricos" ou quaisquer variantes disso, como os vigilantes da ideologia. Em todos os casos, do que se trata aí é de pretender-se o centro capaz de julgar os demais. Na luta para que sejamos autônomos em todos os aspectos da vida – cultura, economia, valores, diversão, lutas concretas, etc – devemos sempre nos construir como parte da mesma experiência revolucionária de tod@s @s proletarizad@s e não como aqueles que "iluminam caminhos ou dirigem os destinos da classe". Sem a construção cotidiana de uma relação social profundamente horizontal, não é possível combater o fetichismo da política de modo conseqüente.

Paciência histórica e memória de resistência

Não há como se obter uma regularidade na luta por autonomia se a busca pelos objetivos revolucionários – o que se quer a curto, médio e longo prazo – não vier acompanhada de uma paciência histórica ilimitada. Mas esta paciência deve se ligar a uma experiência que a valorize, que lhe dê sentido. Ou seja: pela experiência cotidiana, devemos aprender a construir uma tradição de luta e auto-organização que tanto resgate a memória de resistência d@s proletarizad@s, como a revitalize na luta revolucionária presente.

A relação entre os diferentes tempos das lutas proletárias deve ser desenvolvida entre nós desde o âmbito local até o global. O resgate do passado de resistência para que no presente possamos atualizá-lo e assim ir, praticamente, construindo uma tradição de organização e luta autônoma que permaneça viva é condição da consciência histórica que nos é necessária para que não nos percamos num imediatismo acrítico.

Esse esforço não é de modo algum especializado. Jamais haverá uma relação voltada para a transformação revolucionária se estivermos distantes das experiências de rebeldia cotidiana que germinam ampla e diretamente do meio social e cultural d@s proletarizad@s (no nosso próprio meio, portanto). Saber de modo livresco as experiências do passado é fácil; difícil é entender e sentir como será possível incorporar as lições do passado para nos fortalecer revolucionariamente partindo das nossas próprias experiências concretas de luta no presente. Descobrir isso a partir do nosso cotidiano cultural de proletarizad@s não é possível através do fortalecimento das falsas afinidades e atividades comuns dos auto-proclamados grupos revolucionários e movimentos organizados que se consideram conscientes da necessidade de uma luta revolucionária – eis aqui um modo tênue de apresentar uma vanguarda! Ao contrário, é possível apenas experimentando alternativas por autonomia a partir das resistências parciais que @s proletarizad@s desenvolvemos cotidianamente. Trata-se então de desenvolver permanentemente um diálogo horizontal (relações diretas) entre todos os sujeitos que precisamos fazer a revolução. Isso poderá cumprir um importante papel para que @s proletarizad@s possamos passo a passo nos constituir como uma força social assembleiária, como maioria auto-organizada à revolução social.

Tudo isso significa também uma luta contra o espírito imediatista presente na cultura política das esquerdas. As vitórias imediatas, que são objetos de satisfação dos militantes em geral, são produtos do ativismo ou do dirigismo: ganho de entidades de classe, aumento das fileiras da "organização de vanguarda", enfraquecimento dos adversários, vitórias eleitorais, um registro nos anais da história, manifestações ou eventos bem sucedidos etc. Quase nunca há a preocupação – a não ser de modo periférico – com se as ditas vitórias fortalecem uma força insurgente que se auto-reproduza e se autodetermine a partir da e na base social: locais de trabalho, moradia etc.

Superar o imediatismo é realizar uma prática que considere como vitória "imediata" apenas o crescimento das iniciativas autônomas d@s proletarizad@s, entendidos aqui como a existência de uma memória e de uma tradição vivas. É ver as vitórias sempre vinculadas diretamente a uma coletividade enraizada em seus próprios espaços de vivência cultural e social e não mais às "organizações de vanguarda" ou ganhos de superestruturas. Por exemplo, mais valeria uma luta comunitária radical contra o mercado e o Estado, por mais localizada que seja, do que a "conquista da direção da CUT" pelos ditos revolucionários ou um maravilhoso espetáculo de confronto com a polícia...

A burguesia de tudo faz para apagar a memória histórica de resistência d@s proletarizad@s, pois é uma das principais garantias de manutenção do sistema da passividade imposta. E também o Estado brasileiro trabalha de forma extensiva e intensiva a difusão de uma pretensa "índole pacífica e complexo de inferioridade do povo brasileiro", que é uma das mais fortes ideologias mantenedoras da passividade aqui. Resgatar criticamente a memória da resistência é fundamental para a luta revolucionária.

Horizontalidade

Em nossas experiências devemos buscar negar cotidianamente a representação política e a hierarquia. É a própria história de luta d@s proletarizad@s que demonstra que a comuna ou conselho – formas de auto-organização já constituídas como contra-poder autônomo – surge como uma generalização dos diversos esforços permanentes de auto-organização d@s proletarizad@s. Já foi dito aqui que não há fórmulas ou modelos ideais para a comuna. Não podemos chegar por ai dizendo: "aqui está uma comuna ou conselho popular; filiem-se, entrem, apóiem" etc. Seria artificial e arbitrário. O máximo que podemos e devemos fazer é contribuir para condições em que tod@s nos liberemos da política do sistema e comecemos a pensar, decidir, agir e construir por conta própria e, portanto, com autonomia.

As condições em questão só podem ser realizadas a partir de um cotidiano e perseverante trabalho revolucionário que englobe os mais diversos aspectos das nossas vidas – o cultural, o econômico, o étnico, o sistema de gênero etc. Este trabalho deve se revestir de formas horizontais, de modo que procuremos sempre conceber, planejar e executar iniciativas organizativas diretamente a partir dos nossos locais de moradia, trabalho, diversão ou estudo. Podem ser desenvolvidas iniciativas organizativas que anulem toda e qualquer hierarquia, divisão entre trabalho manual e trabalho intelectual e entre dirigentes e dirigidos.

Os atuais sindicatos, associações de moradores, grêmios estudantis e outras formas organizativas tradicionais de "massa", princesa dos olhos da esquerda, se baseiam exatamente na representação e na hierarquia, desenvolvendo valores e práticas que só reforçam o Estado, como o burocratismo, o corporativismo e a passividade. Essas instituições não podem servir para a luta revolucionária autônoma. Elas estão estruturalmente feitas para sustentar o centralismo estatista da esquerda do sistema e seus partidos.

A comuna ou conselho é antagônica àquelas estruturas organizativas. Mas não é apenas antagônica do ponto de vista dos métodos e das formas de organização; é também no que concerne aos valores: se a "comuna" ou "conselho" depende de uma direção ou de líderes, ela é descaracterizada e passa a reproduzir nas relações cotidianas o mercado e o Estado, pois torna-se representação política e continua a se basear na concorrência dos mais aptos, na lei do mais forte.

A grandiosidade da comuna é que ela só é de fato comuna se a construímos desde sua raiz em nossos espaços originais de vivência social e se todos estamos conscientes, mesmo com intensidades diferenciadas de participação cotidiana nessa construção, do papel que ela encarna, que é exercitar o nosso contra-poder e aniquilar todos os resquícios de valores e de institucionalidade da sociedade fundada numa divisão/dominação de classe.

Assim, cada esforço original oriundo de uma experiência organizativa autônoma deve desde o início ser feito com base na horizontalidade. A comuna poderá se manifestar embrionariamente quando, no meio social e cultural onde estamos, começarmos a construir espaços de convivência horizontal, baseado em relações diretas e valores anti-mercado e anti-Estado nas diversas dimensões das nossas vidas. A nossa criatividade e as situações e condições concretas das realidades locais nos indicarão sempre os caminhos e as formas organizativas adequadas, inclusive se serão públicas ou clandestinas, massivas ou restritas: centros culturais, restaurantes comunitários, movimentos específicos, grupos de jovens, assembléias de gênero, times de futebol, escolas livres, associações rurais, rádios comunitárias, comissões de fábrica etc. O fundamental é lutarmos em nosso meio social pela criação e fortalecimento do hábito e do prazer de, diretamente, sem representantes e especialistas, coletivamente, estudarmos a luta, tomarmos decisões e as executarmos conscientemente. O esforço deve ser tal que o hábito e o prazer se transformem em uma força moral e social inquebrantável, onde tod@s @s que a fazemos tornemo-la fundamento de vida livre e estejamos decidid@s a tomar todas as medidas necessárias para defendê-la dos ataques que inevitavelmente o Estado realizará quando perceber a mínima possibilidade do desabrochar das comunas ou conselhos.

Não é bom esquecer que por mais diversas que possam ser as iniciativas organizativas que materializam embrionariamente a comuna, elas jamais podem se desenvolver isoladamente. A articulação e a unidade de lutas, de objetivos etc deve ser trabalhada com bastante afinco. O local e o global não se separam. A mundialização da comuna, com toda a sua diversidade de formas e conteúdos, deve ser meticulosamente preparada. Sem isso, dificilmente conseguiremos enfrentar com sucesso a reação capitalista.

Em todo esse processo de construção prolongada, os esforços trabalhados quotidianamente devem ser tais que possam facilitar aos poucos as condições históricas para a generalização da subversão total da institucionalidade do Estado. Concretamente, não podemos criar os espaços autônomos de convivência horizontal como se fossem ilhas utópicas isoladas do mundo real. Desde o início, eles devem se prestar à resistência revolucionária, desenvolvendo-se na prática como lugares sociais e culturais paralelos às instituições do Estado, anti-estatais e, necessariamente, contra as relações de mercado. Deverá chegar o momento, por exemplo, de desconhecermos a autoridade dos governos, suas câmaras municipais, congressos nacionais, assembléias legislativas, partidos políticos, centrais sindicais, senados, fóruns de ONG, etc e começarmos a tomar as nossas próprias decisões e executá-las por nossa própria conta. Muito provavelmente isso corresponderá a uma generalização territorial das diversas formas organizativas da comuna. Mas esse momento crucial só pode acontecer se tivermos amadurecido revolucionariamente por nossa própria experiência. Tal amadurecimento é uma realização que pode ser potencializada por iniciativas subversivas parciais a partir dos diversos embriões da comuna firmemente estabelecidos em vários locais, globalmente.

Campanhas subversivas unificadas contra a política do sistema

A atuação comum em rede das mais diversas experiências de auto-organização social deve ser estimulada. Este é um componente importante da prática organizativa autônoma. Essa atuação deve corresponder a uma série de campanhas, baseadas em tantas formas de luta quantas forem possíveis e necessárias, que demonstrem tanto a necessidade de um antagonismo radicalmente organizado em relação aos valores e a institucionalidade do sistema capitalista como que estes últimos são inconciliáveis com a vida da natureza e da humanidade. Isto em linhas gerais significa preparar as condições para desenvolver resistências em rede que potencializem uma guerra permanente de desgaste e de fustigamento contra o sistema.

Essas campanhas descentralizadas precisam ser planejadas permanentemente como atitudes subversivas organizadas que sirvam para o acúmulo real de forças do movimento global autônomo, de seus valores e organismos embrionariamente comunais. Devem ter a capacidade de revelar para a máxima quantidade possível de pessoas, seja para as que estão apenas nos locais onde concentramos nossos esforços de auto-organização ou seja para a população como um todo, que a sociedade civil e o Estado capitalista são incapazes de resolver os problemas básicos da humanidade e que suas perpetuações significarão apenas a barbárie e a continuidade do sofrimento.

As diversas iniciativas organizativas autônomas, precisaremos avaliá-las, coletiva e constantemente, as conjunturas, a correlação de forças na sociedade e a sua capacidade de ação a fim de determinar quais campanhas podem e devem ser construídas de acordo com os objetivos que se quer alcançar. Devemos também estar atentos a todos os fatos políticos que revelam os modos como a exploração e a opressão da sociedade mercantil e do Estado barbarizam e desgraçam a vida humana e da natureza. Assim, desmascarar a democracia dos ricos, o racismo, o consumismo, a destruição do ecossistema, a opressão de gênero e tudo aquilo que representa o mercado e o Estado na vida das pessoas deve ser uma atitude cotidiana e, se possível, planejada coletivamente de todas as iniciativas organizativas autônomas.

Quando se fala em campanhas unificadas tende-se naturalmente a esperar por definições superestruturais, de fóruns gerais, com maior ou menor representação, a respeito do que se deve fazer. Isso acaba reproduzindo a cultura política estatista. Mas se queremos ser mesmo coerentes, devemos, além de buscar o consenso organizado, estabelecer mecanismos de democracia direta (assembléias gerais, plebiscitos etc) também a respeito das decisões sobre as campanhas a serem realizadas. Não importa se será mais demorado ou difícil, pois ou a luta é integralmente de todas e todos ou então será apenas de uma vanguarda.

Mas também nenhuma iniciativa organizativa autônoma é obrigada a esperar pelas outras ou se submeter a decisões nas quais não teve participação direta. Cabe-lhe sempre, se quiser, tomar suas próprias iniciativas, realizar suas próprias campanhas. Mas seria sempre razoável se a união de todas e todos fosse fator tão essencial quanto as particularidades de cada um.

Unidade e logística em rede

Nenhum indivíduo ou coletivo que luta pela autonomia revolucionária e repudia qualquer papel de vanguarda poderá construir um mundo enquanto extensão apenas de sua visão particular ou exclusivamente a partir de seus próprios esforços. Sabemos da grande diversidade existente nesse campo revolucionário autônomo. A sociedade sem classes não pode ser homogênea. Seus sujeitos também não. Assim, precisamos de atitudes que demonstrem o respeito à diversidade e uma capacidade de unidade no interior dessa mesma diversidade. Ou nos unimos e nos relacionamos intimamente ou o sistema nos esmagará investindo apenas em nossa divisão, em nossos isolamentos e nas recapturas de nossas iniciativas pelo mercado (a reintegração domesticada!). Ademais, qualquer iniciativa irredutível (como tod@s, aliás, devemos ser!) isolada será cedo ou tarde esmagada sem piedade!

Mas o que fazer para realizar essa conjunção? Primeiramente, é preciso afirmar que a atuação em rede é uma prática viável de unidade sem que os diversos sujeitos envolvidos no processo percam as suas identidades próprias, mas ao mesmo tempo as façam dialogar abertamente, sem jesuitismos. Atuar em rede de autonomia não é caminhar em direção a fusões orgânicas de grupos e indivíduos afins e nem tampouco é realizar uma frente única ou ampla de "forças" políticas e indivíduos de vanguarda com base em ditos objetivos mínimos ou transitórios. Ela não se volta para o fortalecimento das ditas vanguardas ou para a luta por direção revolucionária na luta de classes. A atuação em rede busca "apenas" desenvolver – aprendendo no cotidiano como fazer – o processo de construção da comuna e dos seus correspondentes valores, que em essência é diverso, sem princípio único e descentralizado.

 

A atuação em rede é, portanto, o diálogo permanente, não conjuntural, fundado numa prática comum e diversa, entre as várias experiências autônomas de luta por autonomia. É de suma importância que esse diálogo forje uma crítica prática de totalidade e, assim, produza a longo prazo várias formas de contra-poder d@s proletarizad@s que confluam no sentido da autonomia revolucionária, de uma sociedade livre, sem mercado e sem Estado.

Mas de nada adianta uma unidade em rede se não é erguida uma logística adequada para ela. E uma logística construída também em rede. Evidentemente, cada experiência de prática organizativa autônoma precisa criar sua própria logística, caso contrário não haverá nada mais que meras boas intenções e os trabalhos locais muito provavelmente serão apenas retóricas. Também, de nada adiantaria construirmos logísticas voltadas para nós mesmos e àqueles que nos são afins, caso contrário em nada mudaríamos os vícios de gueto político. De preferência, cada logística "particular" deve necessariamente estar aberta a tod@s @s proletarizad@s de seus locais de atuação. Entretanto, mesmo que cada coletivo e/ou indivíduo tenha sua logística de acordo com sua linha particular de trabalho e suas necessidades, deve haver uma conjunção entre todas e todos do ponto de vista da logística para a atuação comum em rede.

A definição da logística em rede requer a compreensão de que haverá sempre distintas linhas de trabalho social ou de prática organizativa autônoma, as quais podem ser motivos de críticas construtivas entre uns e outros (será preciso e importante que haja essa tolerância mútua). Logo, essa logística deve ser feita com base exclusivamente nas necessidades muito bem delimitadas da atuação em rede. Aqui já podemos identificar algumas necessidades básicas:

Pode haver outras necessidades, mas é melhor que o debate coletivo determine-as adequadamente.

A logística é parte fundamental da organização da luta revolucionária, até mesmo para aqueles e aquelas que pretendem contribuir pela crítica prática da autonomia.

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