Os novos rumos da educação

A crise do capital e os parâmetros curriculares nacionais

Rômulo

A escola, forma predominante de educação na sociedade contemporânea, tem assistido nos últimos anos a um discurso mudancista que clama por novas atitudes em seu interior e que busca redefinir seu modelo organizacional e sua condução do processo de ensino-aprendizagem. Segundo o discurso oficial, a nova maneira de organizá-la faz parte de um plano de integração desta aos princípios da sociedade democrática, na qual a participação e a igualdade de oportunidades são pilares fundamentais. Como parte do discurso e das ações reformistas, um enorme aparato tem sido montado para garantir que estas propostas possam alcançar êxito. Novas leis são aprovadas e o ensino passa a ser organizado de diferentes modos em todos os graus.

O centro da discussão parece ser a formação humana, no momento em que o capital, diante da crise de superprodução e da conseqüente necessidade de destruir forças produtivas, impõe uma nova maneira de organizar e gerir as empresas (o toyotismo). Na perspectiva da burguesia, este modelo, que tem como fundamento a produção baseada em princípios científico-técnicos, age com dupla função: por um lado, libera mão de obra, seja com a simples demissão ou com a terceirização, e, por outro, coopta e insere o trabalhador na dinâmica "democrática" de um mundo ilusório em que não existem mais antagonismos, mas cooperação, parceria e solidariedade de classes. Acreditam ainda que a história acabou e o capitalismo se naturalizará como etapa final daquela. Por isto, precisamos formar homens críticos, que saibam tomar decisões e resolver problemas em equipe, pois a nova forma de produzir assim o exige. O modelo produtivo precisa de homens inventivos, participativos. Homens que se reconhecem como seres históricos, mas, entendemos nós, homens que neguem suas próprias histórias e assumam a história da dominação da classe opressora sobre si. A crítica permitida é a critica sistêmica, aquela que se dá por dentro da organização e nunca aquela que irá além dela e de seus interesse utilitários. O fetiche da mercadoria é a regra. A empresa e a escola devem produzir com competência e qualidade. A qualidade do produto se consubstancia justamente na satisfação do cliente e na garantia de maiores lucros, estes sempre mais concentrados e centralizados nas mãos dos detentores do poder.

É nesse contexto que surge uma nova legislação e documentos como os Parâmetros Curriculares Nacionais, que apesar de não serem leis, se impõem como se o fossem. Os mesmos, usando apelos democráticos, dissimulam sua real função à medida que consegue iludir os educadores, pelo uso de uma linguagem próxima a utilizada pelos setores avançados na década de 80, ao tempo em que se compromete com linhas teóricas e metodologias simpáticas à grande quantidade de professores, principalmente o construtivismo de Piaget e dos pós-piagetianos. Na verdade, um discurso de "agrado geral", pois cita inclusive os psicólogos socialistas Vigotski e Luria e tem como principais representantes no Brasil a esquerda esclarecida de Porto Alegre, representada especialmente pela deputada Ester Pillar Grossi (PT-RS). Um discurso que trata basicamente dos processos internos da escola, sob viés psicologista e que responsabiliza os professores pelas mazelas criadas historicamente pelo sistema. O caráter social da educação só é reconhecido à medida em que o capitalismo necessita inserir os indivíduos em sua lógica produtiva. Neste sentido, argumenta-se que o processo produtivo, por ser eminentemente social, necessita de homens preparados para desenvolvê-lo. A escola deve ser um agência fundamental na formação das subjetividades adequadas a esse processo.

Na verdade, o que está em pauta é a redefinição do papel da escola no contexto da crise do capitalismo contemporâneo e sua luta em utilizar a instituição escolar como um instrumento fundamental para a garantia da permanência do modelo social baseado na exploração da maioria. Assim, a escola deve formar indivíduos que se adaptem à dinâmica da fase monopólica do capitalismo, que segundo Lima (Os equívocos da excelência. As novas formas de sedução nas empresas, Vozes, 1995), busca formar um indivíduo "jogador, megalomaníaco, teatral, cooptável, viril, simpático e generoso".

Esta é uma das saídas apresentadas pelo capital e pelo Estado neste difícil momento de crise e diante da impossibilidade de resolverem problemas cruciais de interesse da maioria, coisa a que sequer se propõem.

É por isto que a inserção na lógica dos PCN’s fere os interesses dos trabalhadores em educação e dos trabalhadores em geral. Devemos, portanto, conclamar a todos para resistir ao aparato ideológico montado para a aceitação passiva dos Parâmetros Curriculares Nacionais, denunciando seu conteúdo burguês e por isto comprometido com a dominação de classe hoje existente. Combater a lógica dos PCN’s é combater a lógica do capital em crise e caminhar junto a um tipo de sociedade em que a educação deixe de ter um sentido meramente pragmático e passe a ser uma ferramenta essencial de formação de seres irmanados para exercerem a autonomia e a liberdade.

 

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